Mas, para não dizer que não
politiquei, quero falar sobre outro assunto.
Miopia é aquela praga que se
prega nos olhos e nos impede de ver com clareza o que está diante dos nossos
olhos. Envolvemo-nos tanto com o
cotidiano, que às vezes esquecemo-nos de observar o que nos acontece com algum
distanciamento e percebermos que, apesar de tudo o que indiscutivelmente há de
errado, há sim coisas a serem admiradas.
Época de eleição e, o mais comum,
é ouvirmos dos pouco interessados em se aprofundar sobre os fatos e candidatos
que é tudo a mesma coisa, a praga da generalização.
Não é bem assim.
Nosso país tem muita coisa
errada, muita mesmo, dá até vergonha, daquelas que se estivéssemos na sala de
aula do mundo, e alguém perguntasse quem é brasileiro, ergueríamos o dedo
encabulados, meio sem jeito de admitir que somos oriundos lá daquele lugar do
sul do mundo onde tanta coisa é feita de qualquer jeito. Mas, repito, não é bem
assim.
Talvez você ache chato, sem graça
ou que tudo vá acabar em pizza, mas estamos vivenciando um acontecimento
histórico: o julgamento do mensalão.
Em 1992, o mundo presenciou um
dos maiores julgamentos políticos da história moderna. Não, não estou falando
do Impeachmant do Collor, mas da Operação Mãos Limpas realizada na Itália, onde
num julgamento amplamente televisionado, foram investigadas, julgadas e
condenadas as ligações entre o então governo italiano, a máfia, bancos,
Vaticano e Maçonaria. Foi uma varredura, então, sem precedentes.
Pode não parecer, mas o
julgamento do Mensalão é algo de igual importância e impacto na vida política
do país. Toda uma estrutura corrupta sendo julgada, exposta à opinião pública e
colocando no banco dos réus aqueles que sempre se julgaram imunes a ele.
Sim, pode ser que, no fim das
contas, alguns menores sirvam de boi de piranha, e os que realmente encabeçaram
a roubalheira escapem ilesos, mas existe algo maior do que o julgamento em si,
a fotografia de um país transformado.
Já pararam para perceber que num
país onde até pouco tempo negros vivam em senzalas, agora tem um dos seus
representantes como ministro máximo da justiça e sendo ele o responsável pelo
julgamento de uma quadrilha de homens brancos?
Embora possa não parecer nada
demais, pois você cresceu num país onde a igualdade está mais difundida, esse
simples elemento no julgamento em questão já é, por si só, lindo e louvável!
Um negro, no nosso tribunal
maior, enquadrando criminalmente um bando de canalhas brancos. Ok, tem uns
mulatinhos ali no meio, mas você entendeu o que eu quis dizer.
Mais do que isso, temos uma
presidente mulher – outrora guerrilheira perseguida política - , depois de
termos sido geridos por um nordestino semi-letrado que promoveu grandes
reformas sociais do nosso país, depois de termos sido geridos por um sociólogo caboclo
que estabilizou uma economia desestruturada há mais de 500 anos. Todos tiveram
grandes realizações, assim como grandes falhas em seus mandatos, mas, apesar
disso, em todos eles percebo um saldo positivo. Mas todos são exemplares de
brasileiros que aconteceram num país onde normalmente não teriam como. Temos
deputados eleitos com a bandeira de defesa dos gays. Sim, temos deputados
palhaços também, mas são fruto da nossa pluralidade social e, de certo modo, os
verdadeiros representantes das classes que compõem o país que somos.
Em suma, apesar dos pesares,
mesmo com tudo o que precisa ser erradicado da vida pública, dos desmandos,
absurdos que ocorrem todos os dias entre aqueles que são responsáveis pelo
governo de uma nação tão grande (certamente tratarei em algum momento de
assuntos como Copa, Olimpíadas, obras desnecessárias e afins), consigo enxergar
no meio disso tudo pequenas revoluções sociais que, mesmo com tudo o que há de
errado, me dão algum orgulho de dizer: “sou brasileiro”.
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