Passado o primeiro trimestre da
nossa gravidez, agora tentarei trazer pelo menos uma vez por semana, algum
assunto mais prático e científico a respeito do processo de espera e chegada de
uma nova pessoa à família. Não sei se conseguirei realizar esta meta, pois sou
um leigo em ciências da saúde, e o que escreverei será fruto das minhas
constatações após as inúmeras leituras que tenho feito, conversas com nosso
obstetra e com amigos que também estão desfrutando do privilégio da
maternidade/paternidade.
Para início dos trabalhos,
falemos, pois, sobre a dicotomia: Parto Normal X Cesariana.
O assunto é polêmico, mas não
deveria ser. E a polêmica se deve, basicamente, por desinformação, ou por
tomada de decisão em cima de análises superficiais de algo que deveria ser
refletido com mais atenção e cuidado, uma vez que trata de como receberemos
nossa menina depois dela ter passado 9 meses no quentinho da barriga da mamãe.
Sempre tive uma opinião que me parecia
absolutamente normal, natural e óbvia. Acreditava que não poderia haver maneira
melhor de realizar um parto, do que a cirurgia Cesariana. Mas, antecipo, não
acreditava nisso por pensamentos que muitos defensores da Cesárea têm, de que
Parto Normal é coisa de hippie e afins, nada disso. Pensava assim por que na
minha família isso era o normal. Minhas irmãs e cunhada trouxeram ao mundo 3
meninos e uma menina, todos via cesariana. Quatro crianças saudáveis, felizes,
inteligentes e bonitas nascidas de cesariana. Na minha cabeça, esse era o jeito
certo de se ter um bebê, sendo que o Parto Normal – em tempos modernos como o
que vivemos – só era feito em situações de emergência, caso a mãe não conseguisse
aguardar a chegada até a maternidade, aquela coisa de policial fazendo parto no
meio da rua, enfim, pode parecer – e de fato é – uma baita ignorância tal
confissão vinda de um cara com 33 anos, curso superior, vindo de uma família
classe média, que já leu uma penca de livros, mas era o que eu acreditava. Por
ignorância, eu admito, mas era o que eu tinha como normal.
Foi quando engravidamos, que
comecei a estudar a respeito, ler e me instruir com mais atenção sobre as
coisas que envolveriam a chegada da nossa Clarinha. A Priscilla já tinha muito
clara a diferença das consequências, implicações, vantagens e desvantagens
sobre um método ou outro. Pela certeza de que um dia seria mãe, já havia
estudado o assunto com bastante profundidade há muito tempo. Ou seja, aprendi muito
com ela, pois, até então eu não enxergava o Parto Normal como uma possibilidade
– exceto num parto emergencial – e ela, estranhamente, não via a Cesariana como
uma possibilidade – exceto num parto emergencial. Alguma coisa naquela discussão
não estava se encaixando, nós dois tínhamos preferências distintas, com a mesma
ressalva, alguma pecinha estava fora do lugar. Foi quando a Pri pediu que eu me
afastasse um pouco da tela, para conseguir enxergar a imagem inteira, com o
nariz colado nela, eu só enxergava borrão. Enfim, através da Priscilla eu
entendi o quão equivocado eu estava, não por mal, mas por ignorância.
E ao buscar informação, artigos
acerca deste tema, me deparei com fóruns acalorados onde aparentemente o que se
vê é mais vontade de ter razão, fazer o seu ponto de vista se sobressair sobre
o do outro, do que um esclarecimento recíproco.
Nestas discussões, vejo três
tipos de pessoas:
1 – Pessoas mais esclarecidas, que
buscam se informar e embasar suas respostas antes de argumentar acerca de um
ponto de vista ou de outro;
2 – Pessoas preconceituosas e
burras (há uma diferença bastante grande entre a burrice e a ignorância,
enquanto o segundo não teve acesso à informação correta, o primeiro não faz
questão de aprender, pois acha que as coisas acontecem assim por que sim e tá
acabado), que não se dão ao trabalho de ouvir o outro lado e refletir a
respeito das suas convicções e, ao invés de praticar a empatia, se colocar no lugar
do outro para tentar entender suas razões, prefere rotular de hippie, natureba,
bicho grilo e uns tantos outros adjetivos menos elogiosos do que estes que eu
citei.
3 – Pessoas ignorantes, como eu
era até então, que simplesmente nunca haviam sentido a necessidade de se informar
a respeito do tema, e aceitavam como certo o que seus próximos lhes dizia, mas
que agora, por estarem vivenciando a experiência da maternidade/paternidade,
estavam ali naqueles fóruns buscando ampliar seus entendimentos sobre aquele
turbilhão de emoções.
Nestes estudos, se percebe
claramente a falta de informação, falta de estrutura das maternidades – mesmo as
particulares -, falta de profissionais capacitados de uma maneira mais humana,
enfim, vai da informação a infraestrutura básica as questões que envolvem a
decisão mais adequada sobre o parto.
Mais do que defender o parto
normal, importante que se diga, há situações em que sim, a cesariana é imprescindível,
sob pena de mãe, bebê ou ambos, estarem com suas preciosas vidas em risco. Em
casos assim, não há o que se discutir, mesa de cirurgia na hora!
Contudo, em condições normais de
temperatura e pressão, não há argumento que justifique a escolha pela cesariana
em detrimento do parto normal.
Cesárea pode ser mais cômodo para
o médico, para a mãe que quer se esquivar da dor – que nem sempre ocorre,
importante que se diga – para o pai que não quer ver a esposa chorando, enfim,
uma série de razões, mas, o mais importante é saber que não se deve tomar as
decisões que envolvam a chegada de um bebê baseadas no comodismo. Se o
comodismo é importante para os pais, mais cômodo ainda é não ter filho, pois o
bebê vai chorar, vai ter cólicas, vai exigir atenção, vai cagar e a esposa vai
pedir para você trocar a fralda justamente na hora em que o jogo do seu time
vai estar passando na televisão, aquela parte do orçamento reservada para o
happy hour de sexta pode ter que ser destinada às fraldas, enfim, um bebê
envolve milhares de coisas e experiências maravilhosas, menos comodismo.
Antes de engravidarmos, fizemos
um test-drive com uma série de ginecologistas e obstetras para encontrarmos um
que nos fizesse sentir seguros na condução da gestação que programávamos.
Analisávamos como se comprássemos um carro novo todos os opcionais dos
profissionais. Do atraso na consulta as titulações, das convicções ao cuidado
em esclarecer as dúvidas, do local onde ficava o consultório as maternidades
onde ele realizavam seus partos, enfim, uma série de fatores para que
estivéssemos totalmente seguros de termos encontrado a pessoa certa para nos
ajudar no momento mais importante das nossas vidas. Encontramos!
Mas, mais importante do que
termos encontrado os profissionais que estão acompanhando o crescimento da
Clarinha, foi descobrir os diferentes tipos de médicos que existem. Claro, em
qualquer profissão há diferença, mas é mais delicado quando o assunto é
gravidez.
Depois de muito ler, cheguei a
conclusão de que um médico obstetra que de início indica cesárea, NÃO É UM
PROFISSIONAL SÉRIO!
Evidente que a decisão final cabe
aos pais, eles deverão estar seguros de qual método optarão para receber o seu
bebê, mas um bom médico deverá sempre aconselhar a escolha do parto normal como
primeira opção.
Talvez você esteja se
perguntando, como eu me perguntei, por quê, então, tantos profissionais indicam
de cara a cesariana?
Por comodismo!
Assim como o comodismo não combina
com homens e mulheres que querem ter um filho, o mesmo deveria valer para
médicos obstetras.
Mas que comodismo?, você me
pergunta novamente.
Vários. Compreensíveis se
pensarmos num ser-humano que pode estar cansado, mas incompatíveis com quem
assume a missão de trabalhar com a saúde. Sim, provavelmente mais do que as
outras ciências, medicina é uma missão que precisa ser levada muito a sério,
não cabe leviandades no seu exercício.
Imagine, sábado a noite, você e
sua esposa resolvem ir à Lagoa da Conceição comer um sushi, pedem uma garrafa
de saquê ouro, e quando o garçom faz a bebida transbordar pelas bordas do seu
copo para desejar-lhe sorte, toca o seu telefone, uma paciente entrou em
trabalho de parto e, mesmo sendo 22:30, você terá que largar sua esposa, o
saquê, o sushi e ir voando para a maternidade. Mais do que isso, a sua paciente
pode passar a noite inteira de sábado, o domingo inteiro e, só quando estiver
passando a evolução – ou não – do Ronaldo no Medida Certa do Fantástico, é que
o bebê nascerá e você estará finalmente liberado para ir pra casa, comer um
sanduíche – a despeito do sushi da noite anterior – e desabar de sono na cama,
rezando para que nenhuma outra paciente entre também em trabalho de parto. Aí,
você como médico pensa, peraí, o que é melhor, eu posso marcar uma cirurgia
para o sábado a tarde, termino em 30 minutinhos e a noite posso ir comer meu
sushi e tomar meu saquê sossegadinho, sem me preocupar com chamadas noturnas,
por que vou passar esse trabalho todo? POR QUE MEDICINA NÃO ENVOLVE COMODISMO!
Se queria algo mais fácil, que escolhesse outra profissão, medicina é lindo,
mas assim como a paternidade, não é cômoda. Que fizesse o que eu fiz, optei por
administração. Não, não estou dizendo que administração, gestão, gerência é
fácil. Não estou dizendo que qualquer um pode fazer administração. Se você
quiser ser um bom administrador e crescer na profissão, vai ter que estudar
muito, suportar muita pressão, mas dificilmente vão te ligar no meio da
madrugada para rever com urgência um item do planejamento estratégico do seu
setor. Antes que xiitas venham me criticar, não, não escolhi administração por
comodismo, ela também envolve vocação, uma vocação que eu acredito ter, mas
assim como eu tenho que ter responsabilidade na hora de tomar uma decisão que
envolva o fluxo de caixa da empresa que me contratou, sob o risco de colocar em
crise a saúde financeira da empresa, um médico deve estar totalmente ciente que
suas decisões envolvem a saúde e a vida de pessoas. Enfim, se quiser ser um profissional
medíocre, fazer o curso nas coxas, tanto faz a escolha, medicina ou
administração, você pode ser pra sempre um sub-gerente medíocre ou um emissor
de atestados de posto de saúde. Em qualquer área do conhecimento há espaço para
os medíocres e para os brilhantes, mas jamais admitirei que um médico medíocre
chegue perto da minha filha.
Além da comodidade que uma
cesariana oferece ao profissional obstetra, ele pode ganhar em escala ao optar
em dar preferência por este procedimento. Dificilmente um bom profissional fará
um parto, seja ele cesariana ou parto normal, pelo plano de saúde. E não os
culpo, é ridículo o que os planos de saúde pagam aos médicos. Por um parto o
médico recebe em média R$250,00 da Unimed, isso é um valor ofensivo! Coloque aí
que entre faculdade, residência e especialização, um médico estuda aproximadamente
10 anos para receber a titulação de obstetra, não é justo que depois de tanta
dedicação para se capacitar, ele receba apenas R$250,00 pelo exercício do seu
delicado ofício. Eu não acreditaria na qualidade de um médico que fizesse um
parto por este valor. Enfim, um parto custa em média algo entre R$3.000,00 e
R$5.000,00, outra quantia que deve ser colocada no planejamento dos casais que
pretendem engravidar. Mas pensemos em economia de escala, se eu sou médico e cobro
R$3.000,00 para realizar um parto, se eu realizar o parto normal corro o risco
de realizar apenas um procedimento ao longo do dia, pois o trabalho de parto
pode ser demorado. Agora, se eu oriento minha paciente a realizar cesariana,
procedimento que pode ser realizado tranquilamente em 30, 40 minutos, posso
realizar 3 partos de manhã, mais 3 partos a tarde, ou seja, posso faturar
brincando R$18.000,00 num dia, trabalhando apenas em horário comercial, podendo
deixar meu celular desligado no período da noite e ir comer o sushi na Lagoa
com a minha esposa tranquilamente, vou me estressar pra quê?
Além do aspecto financeiro, há o
risco que uma eventual imperícia pode representar para os médicos. Se num parto
normal a utilização do fórceps for feita de maneira inadequada, posso machucar
gravemente tanto o bebê quanto a mãe. Alguns dos casos que envolvem algo muito
tratado recentemente no excepcional site: www.cientistaqueviroumae.com.br,
que trata da violência obstetrícia. Caso ocorra um problema desta natureza, o
médico estará sujeito a uma série de implicações legais, um risco que talvez
ele não esteja disposto a correr “só” para que a criança possa nascer de uma
maneira mais natural do que uma intervenção cirúrgica.
Além do risco que envolve uma
eventual imperícia, há o problema crônico do nosso país de falta de
infraestrutura. Florianópolis, capital de Santa Catarina, um estado rico, um
lugar onde ainda que as pessoas não andem todas de iate, as desigualdades
sociais, oportunidades e acesso a saúde são bem melhores do que nos estados do
norte e nordeste, enfim, aqui em Floripa existe apenas uma, repito, UMA sala de
parto. Aí você pode dizer, claro que não, Floripa têm várias maternidades, tem
as públicas, umas 4 ou 5 particulares, tem um monte de salas de parto. Não,
meus amigos, sala de parto existe apenas uma em uma clínica particular, sala
esta que pretendemos utilizar para recebermos a nossa Clara, todas as outras
possuem única e exclusivamente centros cirúrgicos. Existe uma diferença muito
grande entre uma sala de parto e um centro cirúrgico. Se sua esposa puder optar
em ter o bebê na cama, numa banheira, de cócoras, num lugar com iluminação
regulada, temperatura ambiente controlada, conforto, aconchego, este lugar onde
está a sua esposa é uma sala de parto. Você vai olhar e pensar que está num
quarto de motel, sentindo falta, talvez, apenas do espelho no teto. Mas não,
não é um quarto de motel, é apenas um lugar aconchegante para receber alguém
muito especial, seu bebê, e dar o máximo de conforto para a mulher da sua vida,
a mamãe. Agora, se sua esposa tiver como única opção deitar numa maca, a sala
tiver iluminação branca com spots focais de luz voltadas a ela, sala com
azulejos nas paredes, um tanque de aço inox numa das paredes, neste caso ela
terá seu filho num centro cirúrgico, mesmo que o parto seja normal. Pense
comigo, você passa nove meses criando um ambiente especial para receber seu
bebê, decora o quartinho, busca um berço legal, brinquedos coloridos, tudo para
que seu filho se sinta acolhido quando chegar em casa, mas no primeiro contato
com o mundo ele estará num lugar frio parecendo uma bancada de açougue de
supermercado.
Resumo da ópera, nos falta
informação, infraestrutura, profissionais conscientes do seu papel e de suas
responsabilidades, falta muita coisa.
A natureza é sábia, o corpo da
mulher é de uma perfeição extraordinária, todo preparado para o momento do
nascimento, para que aquela experiência seja o mais tranquila e fácil possível.
Evidente que nem sempre um parto normal é viável, mas quando não houver nada
que coloque em risco a saúde da mamãe e do bebê, ele será sim a melhor opção.
Muito melhor do que uma intervenção cirúrgica feita antes dos organismos da mãe
e do bebê sentirem-se prontos, aptos para o tão ansiado nascimento da criança. Os
dois saberão o momento certo de fazer a coisa acontecer, saberão muito mais e
melhor do que um bisturi gelado.
Ainda que esta primeira análise
tenha sido extensa, ela é superficial, tem muito mais a ser dito e estudado a
respeito, falei de aspectos iniciais, mas voltarei ao tema para descrever o que
representa para o bebê e para a mamãe vir ao mundo de um jeito ou de outro.
O certo é que, caso não haja nada
que coloque as mulheres da minha vida em risco, nossa Clarinha nascerá de parto
normal. Não é sadismo de minha parte, não afirmo isso por que quem vai sentir
dor é ela, como já ouvi acusações neste sentido, nada disso. Será assim, por
que decidimos isso juntos, por que ela me ensinou que este é o melhor caminho.
Não sentirei as dores do parto, mas estarei lá do lado da Pri, vou segurar a
mão dela por quanto tempo for necessário, vinte minutos, vinte horas, elas me
dirão o tempo que o parto durará, quanto tempo precisarão e, até que eu possa
pegar nossa menina nos braços, não largarei a mão da mamãe mais linda do mundo!
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