sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Rodízio


Eu não devia, é errado, eu sei, tu sabes, nós sabemos, mas essa noite lembrei de ti.

Alguém pediu pizza quatro queijos e me lembrei de ti.

É errado, eu sei, tu sabes, nós sabemos, mas lembrei de ti, fazer o quê?

E tocava uma dessas músicas que se derramam sobre as notas, preguiçosas, que pedem o quadril pra lá, depois pra cá, e lembrei de ti. Tu me olhavas, quadril pra lá, depois pra cá. Tu te viravas, quadril pra lá, depois pra cá. Eu te pedia pra mexer assim, e tu mexias melhor do que eu poderia imaginar. E eu não te tocava, e tu dançavas. E eu não te tocava, e às vezes tu me olhavas. E sorrias com o canto dos lábios. E tu me olhavas com a certeza que minhas mãos estavam surtando de vontade de se agarrarem nas tuas sinuosidades, nas formas que ela reza pra ter, busca academias pra encontrar, recorre a dietas pra possuir, e tu exibes como se fosse fácil. Como se fosse óbvio. Como se fosse o óbvio ululante, como diria o escritor-cronista que tu não sabes quem é, mas que saberia te descrever de um modo que eu não teria como. Ele teria argumentos para te descrever melhores do que tinha para descrever um Fla-Flu. Até por que este clássico não seria nada perto do espetáculo que foi ver tuas mãos apertando teu corpo naquela distância que mantinhas de mim, algo entre a segurança e o excesso de confiança, algo entre o fique aí não chegue perto e o me agarre de uma vez, algo entre a prosa e a poesia, algo entre o violino e o overdrive, algo maior e mais belo que o Fla-Flu que ele descrevia, algo maior e mais bonito que um deles sair na frente, o segundo empatar e em seguida virar, para o primeiro novamente empatar e virar mais uma vez, e mais uma vez, e mais uma vez, e mais outra e mais outra, e não seria nada perto do teu quadril pra lá e depois pra cá.

Era rodízio, veio calabresa e tudo bem.

Portuguesa, sem problemas.

Marguerita, ela adorou.

Baiana, ela não conhecia, mas gostou.

Napolitana, ótima.

Frango com catupiry, não curto, mas ela pediu logo duas fatias.

Quatro queijos, aí deu merda...

Não sei se o problema foi o jeito que eu olhei para o garçom quando ele ofereceu, se foi o fato de eu ter aceitado uma fatia ou simplesmente por ter contado a ela, umas semanas atrás, que quando saíamos, a tua pizza preferida era a quatro queijos. Mas deu merda.

Ela ficou transtornada, começou a gritar. Vergonha no volume máximo. Vergonha gritando como funk em carro de playboyzinho com o porta-malas cheio de auto-falantes. E lembrei que uma vez tu me disseste que dançarias funk pra mim. Não sou muito chegado em funk, mas fiquei te imaginando dançando pra mim, devagar, quadril pra lá, quadril pra cá...

E o volume da voz dela aumentava, a voz se alterava, as pessoas ao redor olhavam, o volume só aumentava.

Ora ela me xingava, ora ela te xingava.

Ora eu lembrava do teu quadril pra cá, ora eu lembrava do teu quadril pra lá.

Fiz cara de assustado pra parecer inocente.

Todo inocente tem cara de assustado.

Chamei o garçom e pedi a conta, ela insistia em gritar.

Do mesmo modo que, involuntariamente, minha lembrança insistia em trazer à memória teu quadril, ora pra lá, ora pra cá.

Ela virava pra mim e gritava, eu me lembrava de ti virando pra mim, dançando, devagar e apertando a moldura perfeita e arredondada dos teus ventrículos.

Ela virou de costas e saiu bufando, batendo o pé, eu me lembrei de ti virando de costas e dançando ainda mais sinuosamente, sabendo que quando dizia que adorava te ver pelas costas, não era algo pejorativo. Muitíssimo pelo contrário.

Já na rua, ela me disse que iria para a sua casa e, caso fosse para a minha, que eu não me engraçasse, dormiria de calça jeans.

E me lembrei do jeito que tiravas as tuas. Devagar, sempre devagar. Quadril pra cá, quadril pra lá.

Disse que, caso dormisse na minha casa, além da calça jeans colocaria uma calcinha gigante, bege.

E me lembrei da tua camisola vermelha, curtíssima. Quadril pra cá, quadril pra lá.

Fiquei em silêncio, ela parou de gritar.

Ela pensou que eu estava magoado.

Eu pensava no teu quadril, ora pra cá, ora pra lá.

Ela me pediu desculpas, eu fiquei em silêncio.

Ela me disse que não dormiria de calça jeans, tampouco usaria a gigante calcinha bege. Usaria o que eu pedisse.

Fiquei em silêncio.

Ela disse que faria o que eu pedisse que ela fizesse, desde que eu a perdoasse.

Não fiquei em silêncio. Disse que, ao menos naquela noite, era melhor que ela fosse para a casa dela, não para a minha. Independente do que ela estivesse vestindo. Independente do que ela viesse a vestir. Usaria a preta que sabia que eu gostava.

Eu não disse nada, mas lembrei daquela sua, de oncinha. Quadril pra cá, quadril pra lá.

Ela ficou com os olhos cheios d’água, disse que estava arrependida, mas entendia a minha mágoa. Dormiria na sua casa, amanhã nos falamos, ela disse.

Melhor assim, eu respondi.

Por isso te liguei.

Entendeu?

Agora chega de explicações.

Tire a calça jeans do jeito que tu sabes que eu gosto que tu tires.

Devagar.

Mostre o quão pouco vestida estás aí embaixo desse tecido todo.

Tirei dançando, devagar, bem devagar, do jeito que tu sabes que eu gosto.

Quadril pra cá, quadril pra lá.

Devagar.

Bem devagar.

Quadril pra cá, quadril pra lá...

Assim...

2 comentários:

mundo da lu disse...

ai que gostoso! é sempre melhor qdo tem algum sexo não é mesmo?! acho que o correto é dizer "independentemente", eu sei é estranho, mas acho q é o certo mesmo.
vai lá no meu blog, tbem coloquei uma pitada de sexo por lá, só um pouquinho pra deixar tudo mais divertido.
beijo
lu

Bruna Rafaella disse...

E ele está de volta! que gosto bom
dos seus textos, hummmm olha o cheiro, que delícia!