sexta-feira, 2 de março de 2012

80? 80 é o caralho, a década foda foi a de 90!



Fosse este texto escrito por Jean Mafra, certamente sairia coisa melhor, mas como eu já cansei - e provavelmente ele mais ainda - de tantas sugestões que dou para o "minúsculas", que resolvi eu mesmo dar verbos ao pensar.

Eis que você, ou a maior parte de vocês que me leem segundo o instituto Don Mattos de estatística aplicada a internet, nascidos de 87 pra frente, pagam um pau do caramba para a década de 80, musicalmente falando. Sim, é uma década que tem lá suas coisas interessantes. Impossível desconsiderar RPM, o que mais parecido houve no Brasil com o que o mundo concebeu e deu nome de beatlemania. E você, que me lê e pensa saudosista, "puta que o pariu, como eles eram foda!", só ouviu falar, eu estava lá, o Jean também, e o Daca já era velho naquela época. Sim, você tem razão, eles eram foda!

E teve mais um punhado de gente boa e legal naquele primeiro choro pós-tapa na bunda do tal rock tupiniquim. Legião Urbana foi, para mim, e será para sempre, a maior banda do nosso país, embora não seja a minha preferida, e nem no meu top 3 entra. Mas, embora não seja minha preferida, acho sim a mais importante. Os discos "Dois", "As quatro estações" e "O Descobrimento do Brasil", para mim são coisas difíceis de se conceber, e os três vieram do mesmo trio. Logo, eles merecem algum respeito. Uma fração do meu, pelo menos.

Além deles, aconteceram Titãs, Engenheiros do Hawaii (banda que fui tiete minha adolescência inteira), Barão Vermelho, Capital Inicial (aquele, e não esse que hoje se finge passar pelo outro), Ira!, Camisa de Vênus (essa era fodida!), Raul Seixas (ok, era de 70, mas foi nos 80 que a coisa aconteceu), Rita Lee pós-mutantes (eu sei Jean, também foi antes, mas foi aqui que eu a conheci, e por isso, para mim, é aqui que ela nasce), João Penca e os Miquinhos Amestrados, Blitz, Inimigos do Rei, Celso Blues Boy, Metrô, Dr. Silvana e uma porrada de gente que ia do 8 ao 80, ou era feliz e bobinho, ou era politicamente correto até a medula. Extremos chatos e previsíveis.

Sim, eles eram importantes e foram bons, mas não foram os melhores.

Meus amigos, companheiros e companheiras, a década de 90 foi muito foda!

Acontece que os anos 90 inundaram as rádios com uma diversidade chocante - não aquela gíria dos anos 80 que queria dizer que a coisa era foda, mas realmente um choque nos ouvidos incautos - que incomodava e encantava, tanta a pluralidade que se instalava no dial.

No comecinho, um estouro com Cidade Negra e o seu "Sobre todas as forças", que até quem não gosta de reggae, como eu, não ficou alheio. E surgiu Skank, uma banda vestindo camisa de futebol e tocando um som meio Ska, meio reggae, meio pop-rock, ninguém fazia aquilo no Brasil. E depois uma sequência de bandas que surpreendiam pela maneira diferente que faziam música. Cara, eu não sei te dizer o dia, mas lembro do momento. Era 1994, eu estudava na Escola Técnica Federal de Santa Catarina, e André Guesser -meu eterno amigo-desafeto-rival-ídolo- me chamou no intervalo de uma aula de Termodinâmica e pediu para que eu ouvisse um som, o nome da música era "Eu quero ver o Oco", a banda, Raimundos. Você não sabe o que foi Raimundos. Você ouve e acha legal, mas não sabe o que foi Raimundos. Aquela banda colocava Camisa de Vênus no bolso sem fazer força, os caras eram foda demais! Aí eu conheci através de uma prima uma banda chamada Pato Fu, que fazia outra coisa totalmente diferente do que estávamos acostumados. Meio desenho animado, meio video-game, meio coisadiferenteelegaldeseouvir. Acho que foi através deles que fiquei amigo do Jean. Salve Pato Fu! Comprei ingresso para três shows do Pato Fu naquele ano aqui em Floripa, todos desmarcados por que só tinham vendido, no máximo, 5 ingressos, quatro comprados por mim, meu irmão, minhas primas Patrícia e Melissa e, provavelmente, pelo Jean. No quarto show, veio o clipe de "Sobre o Tempo", algum sucesso e, finalmente, o show aconteceu. Nele, o Jean inventou de dar um mosh quando o refrão da canção dizia "A Unimed é quem vai pagar...", e acertou um chute na boca de Melissa, minha prima e, na época, baixista da minha primeira banda, Boi Verde. Jean levou um esporro do Jhon, mas acho que foi ali que nos tornamos amigos, se não me falha a memória.

Mas isso são reminiscências, depois aconteceu uma coisa absurda, linda, indescritível, chamada "Chico Science e a Nação Zumbi". Se todos os que citei acima já pareceram uma novidade inominável, não dá para descrever o impacto do povo do Manguebeat. Tudo muito novo, tudo muito inédito, tudo muito embabascador! Esta é uma banda que, se você gosta de música, é obrigado a ouvir com atenção, e quando ouvir a primeira faixa do primeiro disco, se dará conta de que não estará ouvindo uma coisa comum, dessas que se encontra em cada esquina, ali pulsa um sangue diferente e, ainda que findados, o pulso ainda pulsa, já diriam os anos 80.

E vieram os Mamonas Assassinas, que hoje parecem pastelão, mas naquela época não havia nada parecido, e foram quem mais perto chegou da febre causada pelo R.P.M.

A DÉCADA DE 90 PARIU A CÁSSIA ELLER!!!!!
Pra quem não sabe, a Cássia Eller era o homem da minha vida!

E, lá no finalzinho da década, aconteceram Charlie Brown Jr. e Los Hermanos, que provavelmente você conhece melhor do que os anteriores citados, que foram fantásticos na mudança que causavam. Não gosto do primeiro e sou fã do segundo, mas sei que ambos foram impactantes. Ainda são, embora o segundo tenha sabido se retirar e o primeiro não se deu conta que só se repete.

E eu falei só do rock, mas nessa mesma década aconteceram Leandro e Leonardo, Zezé di Camargo e Luciano, Gian e Giovani, João Paulo e Daniel, e talvez você pense que não, mas sim, eles foram e são importantíssimos para a música popular brasileira. A verdadeira, não aquela que é tratada como grife, rótulo de coisa boa, mesmo quando não é.

E aconteceu ainda o Razão Brasileira (aí vem o desespero, pan, pan, pan...), o Grupo Raça (era ela e o namorado dela, eu e minha namorada...), o Art Popular (ela tá dançando e o pimpolho tá de olho...), o Sem Compromisso (Mariana te dou, Mariana amor, Mariana parte minha, Mariana minha flor...), o Raça Negra (maravilha, nossas vidas, você e eu, que bom amar...), Só Pra Contrariar (Toda vez que eu chego em casa, a barata da vizinha tá na minha cama...). Negritude Jr. (Tô chegando na COHAB, pra curtir minha galera...), Katinguelê (lua vai, iluminar os pensamentos dela, fala pra ela que sem ela eu não vivo...), Karametade (tudo bem, eles eram uma merda!)

E aconteceu ainda uma das coisas mais fantásticas da nossa música, que você talvez tire sarro, mas são de uma riqueza rara e tão boa que chega a dar vergonha, inicialmente chamado Gerasamba, posteriormente, É o Tchan!. Sim, sim, sim, eles eram ótimos! Aquilo que talvez você chame de Axé, não tinha nada de Axé, era uma espécie rara e já quase morta de samba de roda. E dos bons! Um descompromisso, um swing, um gingado, tudo aquilo que veio entre Chiquinha Gonzaga e Noel Rosa, e que colocamos pra baixo do tapete, mas que Beto Jamaica e Cumpadre Washington trouxeram à tona junto com a bunda da Carla Perez. Que bunda...

Muitos outros importantíssimos estiveram lá na década de 90, mas agora me fugiram à memória e amanhã ficarei puto ao me dar conta que esqueci deles. Mas o certo é que para mim, que estive em ambas, é nítido, puro e cristalino, ainda que ótima, linda e rica, a década de 80 não dá nem para o cheiro da década de 90.

Agora, se me dão licença, vou ali cantarolar para minha amada: "Eu queria ser, o banquinho da bicicleta..."