segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Matéria-prima


Por quê você fez isso comigo? Foi só por diversão?

Não, minha querida, de jeito nenhum.

Você não tinha o direito de escrever a nossa história, transformá-la num conto e publicá-la no seu blog!

Não se preocupe, minha querida, os outros não vão saber que é a nossa história. Vão ficar desconfiados, como ficam com tudo o que eu escrevo, vão ficar se perguntando se é auto-biográfico, mas vou negar, dizer que não, que é só mais um conto. Fique tranqüila, ainda que fiquem desconfiados, ninguém vai saber de nada.

Claro que vão saber! Temos amigos em comum, eles saberão que a história trata do nosso caso, do caso que tivemos.

Minha querida, eles vão achar que é só mais uma história, não se preocupe. As pessoas até prestam atenção no que eu escrevo, mas ninguém me leva muito a sério, fique tranqüila. Vão achar que é só mais uma brincadeira minha.

É isso que eu fui para você? Só mais uma brincadeira?

Não, minha querida, de jeito nenhum. Você não foi uma brincadeira, mas serviu de matéria prima, o que eu posso fazer?

Você pode ir lá no seu blog e tirar o texto do ar.

De jeito nenhum! Você já reparou como aquele texto deu audiência? Milhares de pessoas indicaram no twitter, mais de três mil acessos em menos de uma hora, meu recorde absoluto! Depois dele tive dezoito novos seguidores! É muita coisa, não posso desprezar uma audiência dessas. Já pensou se um destes dezoito for de alguma editora e acabe se interessando em publicar um livro meu? Você é uma jornalista famosa, carreira consolidada, ganha bem, eu sou só um balconista aspirante a escritor. Não posso me dar ao luxo de desprezar uma audiência dessas.

Você não tinha o direito de me expor desse jeito.

Eu troquei os nomes, ninguém vai saber de nada.

Claro que vão saber! Já me perguntaram se era de mim que tratava o texto.

Relaxe, meu bem, que fiquem desconfiados, nunca vão saber de nada mesmo. A verdade só a nós pertence.

Que verdade? Você me flertou, eu resisti, resisti, e depois que eu finalmente cedi você deu no pé. Você brincou comigo! Ainda mais depois de uma noite daquelas! Eu tinha que ter dado no pé, não você!

Não, minha querida, eu não brinquei com você. Mas serviu de matéria-prima, eu não podia desprezar uma história dessas. Há tempos eu buscava uma história realmente boa para publicar, foi a sua/nossa, o que eu posso fazer?

Só fico pensando com quantas mulheres você fez esse tipo de calhordisse!

Não muitas. Algumas, mas não muitas. Mas você não tinha como deixar passar, você é famosa, pô! Nunca tinha levado uma jornalista pra cama, não podia deixar a oportunidade passar.

Deixa disso, faz tempo que eu não escrevo algo que preste!

Mas nem por isso deixou de ser famosa.

Você não vale nada!

Mas você valeu muito a pena!

Você só usou as partes que lhe interessavam, teve muita coisa ali que você não contou. No fim das contas eu fiquei com cara de pateta, e você saiu como o bonzão.

Meu amor, você é jornalista, você sabe como as coisas funcionam. Os fatos são o que menos interessa, o que realmente importa é como eles são contados.

Seu canalha!

Um beijo, minha querida. Beijão!

(Dois dias depois...)

QUE PALHAÇADA É ESSA?

O quê?

ESSE TEU TEXTO NO JORNAL, QUE PALHAÇADA É ESSA?

Que é isso, meu querido, é só uma história.

Só uma história o meu cacete! É a nossa história!

Eu troquei os nomes, fique tranqüilo, ninguém vai saber de nada.

Claro que vão saber! Até o meu tipo físico você se deu ao luxo de descrever!

Meu querido, é só uma história, não precisa ficar assim.

Você não tinha esse direito!

Fazia tempo que eu não escrevia uma boa história, se você soubesse como esta edição do jornal vendeu... Nunca a minha sessão deu tanta audiência, choveram emails e cartas na redação, milhares de mulheres se sentindo vingadas. Acho que algumas delas até deviam te conhecer.

Você não tinha esse direito! Você falou que eu broxei!

Mas você broxou!

Mas você disse que não ligava, que isso acontece!

E não ligo mesmo, eu sei que acontece.

Você não tinha o direito de me expor desse jeito! É ridícula essa sua vingancinha! Ridícula e infantil!

Que é isso, meu querido, não é vingança.

Você não tinha o direito de brincar comigo desse jeito!

Eu não brinquei com você, meu querido. Eu só precisava de uma boa matéria-prima, só isso.

Sua canalha!

Beijo, meu querido. Beijão!

Um comentário:

Shuzy disse...

A guerra dos sexos... hahaha