terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Gênesis

Um monte de gente estranha num barzinho.

No deck, o carinha está sozinho na mesa, pensando em terminar rápido a cerveja que pediu para celebrar a chegada das suas ansiadas férias, pois há um rapaz com violão em punho contratado para entreter os clientes que insiste em rechear seu repertório com os maiores sucessos do sertanejo universitário e reggae-gaúcho-mela-cueca. Que porra eu tô fazendo aqui?, pensa o carinha.
Nisso, chega uma turma animada, saindo da faculdade que fica em frente ao barzinho, happy hour, é sexta-feira, oras, eles merecem uma cervejinha depois de uma semana tão puxada.

Não há mais mesas disponíveis no deck, a turma se acomoda em mesas de plástico enfileiradas no corredor da galeria comercial onde fica o barzinho.
Na turma há uma menina de cabelos cacheados e óculos de aro verde.

Eu conheço aquela ali, pensa o carinha. E, no mesmo instante em que pensa isso, pensa também que pode ser interessante ficar mais um pouquinho, apesar da trilha sonora pouco apropriada para suas malévolas intenções.
O carinha saca um guardanapo, pede uma caneta para o garçom, escreve o seu nome e logo abaixo do nome: “Teu futuro marido: 9128-XXXX”.

O garçom leva o guardanapo para a menina, ela o recebe com surpresa, lê, dá uma risada, olha como quem pergunta: “que porra é essa?”, e o garçom aponta para o carinha. O carinha ergue o copo de cerveja como quem sugere um brinde. Ela ri, também o reconhece. Faz tempo, mas lembra bem quem é.
Cantadinha safada, né?

Coisa de bêbado bagaceiro de boteco, né?
Mas, vou te dizer, ela não só guardou o guardanapo, como ligou para o carinha.

Acredite se quiser, onze meses depois daquela sugestão de brinde no boteco, ambos entrelaçavam os braços para brindarem com espumante o casamento consumado, cercados por seus familiares e alguns poucos e especiais amigos.
Doze meses depois daquela insinuação de brinde, lá no boteco, um mês após o brinde de espumante no casamento, ambos brindaram sozinhos com saquê, na sacada do apartamento provisório, pois decidiram que estavam prontos e iriam sim ter um filho, apesar do tempo aparentemente curto desde o bilhete rabiscado no guardanapo.

Quinze meses depois daquela insinuação de brinde, lá no boteco, quatro meses após o brinde de espumante no casamento, três meses após o brinde de saquê na sacada, ambos brindaram com coca cola no apartamento improvisado, pois surgiram dois tracinhos cor de rosa no exame comprado horas antes na farmácia, o que indicava que já não eram apenas os dois, havia uma terceira pessoinha ali, junto deles, naquele apartamento provisório.
Historinha mais água com açúcar, né? Parece esses romances bobos de rodoviária.

Eu sou o carinha, muito prazer.
A Pri é a menina de cabelos cacheados e óculos, embora hoje já tenha trocado a cor da armação.

A Clara, os dois tracinhos cor de rosa no exame de farmácia, hoje uma moça de quase vinte centímetros dentro da barriga da mamãe.
E quando ela disse com os olhos cheios de lágrima, saindo meio atordoada do banheiro: “Meu amor, estamos grávidos!”, foi muito mais legal do que quando deus disse: “Faça-se a luz”.

A gente não precisou de barro nem de costela para fazer surgir a vida, só de amor e um guardanapo. 
 
 

Um comentário:

Anônimo disse...

Que lindo, David!! Me emocionei aqui! :) Mas de onde vocês se conheciam, afinal? Thaís