domingo, 20 de dezembro de 2009

Sobre Antonio, para Antonio. (O texto é gigante, blogue deve ser curto, eu sei. Mas não consegui.)


Vai parecer jogo de cumpadre. Não é.

Ontem, em seu blogue, Transitoriamente , Antonio Rossa caprichou no verbo para falar deste que agora lês. Foi gentil, deixou meu ego, que já é naturalmente inflado, um tanto mais convencido. Olho-me no espelho, e nem mesmo eu me aguento.
Mas o assunto aqui não é minha reação ao texto dele, nem um agradecimento ao post. Por isso é importante frisar: vai parecer jogo de cumpadre, mas não é.

Fato é que o camarada gravou um disco. Um EP com cinco músicas. Antes mesmo de ter ouvido o disco com a atenção que qualquer obra prestes a ser dissecada merece, já tinha o parabenizado pela coragem da empreitada. A arte – a genuína arte – expõe o artista, despe-o, deixa a mostra suas nuances todas. Não disfarça as belezas tampouco as cicatrizes, escancara tudo o que tem para ser visto, o que encanta e o que incomoda. Por isso tanta gente acomoda-se em fazer o trivial, tocar o trivial, escrever o trivial, amar o trivial, viver o trivial. É mais cômodo. Assim diminui-se o risco da crítica e do erro. Além da comodidade do trivial, há a pressa no aparecer. Muita gente incompleta, muita gente que não está pronta, antecipa etapas para mostrar-se, simplesmente pela vontade de aparecer. Eu, volta e meia caio nessa armadilha. Publico coisas que precisariam de mais tempo para amadurecer as ideias na ansiedade de ser lido, e acabo ficando na nata da superfície, perco a oportunidade de apurar as linhas e romper a tensão superficial, mergulhar fundo. Mas não é de mim que eu quero falar.

Antonio faz arte.
Antonio cuida da sua arte.
A primeira música que ouvi foi “Antes da sorte fugir”. E naquela hora, não gostei. Não gostei mesmo, achei alguma coisa estranha que não me descia bem, algo que meus padrões não estavam habituados, apesar de não ter percebido ali – naquele momento – grande novidade. Mas guardei o incomodo para mim, pois sabia que tinha escutado a música enquanto mandava um email para alguém, e logo, não dei à canção a atenção devida.

Gosto muito do Antonio. Bom papo, inteligente, divertido e transmite sempre uma simplicidade que só as coisas e pessoas boas tem. Logo, não poderia simplesmente dizer: “Antonio, meu velho, ouvi e não gostei, falou.” Sei que poderia perfeitamente dizer não ter gostado, tenho certeza que ele não gostaria menos de mim se eu não tivesse gostado da música dele, a criação não é o criador, é parte dele, sei que ele entenderia se eu não tivesse gostado desta parte dele, até por que já manifestei que gosto muito das outras partes (tá meio gay isso, mas quando digo que gosto das outras partes estou falando dos vídeos e demais manifestações artistico-culturais com as quais ele se envolve).
Mas por gostar do Antonio, por gostar de música e por volta e meia (não sempre, confesso) gostar de novidade, baixei o disco do menino e passei o último sábado ouvindo o seu trabalho.

Agora posso falar dele com mais conhecimento de causa.

No ofício de produtor visual, fazedor de clips e afins, Antonio exercita captar das pessoas seus melhores ângulos, mesmo que elas não saibam quais são. Ou ainda, extrai das pessoas umas facetas que elas não sabiam ter. Ele trouxe essa qualidade do vídeo para o som.

A banda de apoio, composta por músicos extraorinariamente talentosos, tanto em técnica quanto em feeling, executa uma sonoridade muito diferente daquela que estava habituado em ouvi-los fazer. Quase todo o time é oriundo da Sociedade Soul, e se tem Gustavo Barreto na jogada, a qualidade está junto como um cachorrinho que não desgruda do pé do seu dono. Para apimentar a mistura, tem o Jiva Lin da Maltines, guitarrista do qual eu sou fã confesso, queria ter uma banda só para tocar com ele. Tenho certeza que se minha extinta banda ao invés de um trio fosse um quarteto, tendo o Jiva como quarto integrante, teríamos feito farofa dos beatles! Tá bom, talvez nem tanto, mas quase isso. Enfim, Sociedade Soul é groove, funk, balanço. Maltines é Indie, rock inglês com cara de inverno. E o Seo Antônio pegou essa galera e tirou dela uma sonoridade totalmente diferente da que eles normalmente executam. Pegou ingredientes bons, utilizados para outras receitas, e criou um novo e ótimo prato.

Sua música me causou uma estranheza inicial, pela sonoridade que ela traz consigo. Primeiro pelo timbre de Antonio, bastante diferente do pop local, ou mesmo do pop de um modo geral. Aliás, a vontade de se expressar artisticamente me parece tão genuína, que apesar do som ser pop, ele não demonstra uma preocupação em sê-lo. Nunca tinha ouvido o gajo cantar, e fiquei admirado com a coragem dos tantos falsetes que vários trechos de algumas das músicas têm. Rossa é ousado no vocal. Seus falsetes me lembram bastante os melhores dias de Fito Paez, nos discos “El amor después del amor” e “Circo Beat”. Insere-os em lugares pouco habituais, e isso traz charme pra música.

A levada folk presente em algumas canções, me remete à clara influência que ele tem, e já batemos alguns papos sobre isso, do senhor Gessinger. O astral da música “O que ficou no coração”, me lembrou a levada da música “Banco”, do disco Minuano, da finada banda Engenheiros do Hawaii. Isso não é uma crítica, é um elogio. Eu gosto daquele disco, não dele todo, mas de parte dele, e “Banco” se inclui na parte que eu gosto.

“Antes da sorte fugir”, que me tinha incomodado, tornou-se meu mantra. Estou no meio daquilo que os astrólogos classificam como “retorno de saturno”, uma revolução pessoal que acontece entre os 28 e os 30 anos. E agora, aos 30, virei minha vida pessoal pelo avesso, arrisquei como nunca tinha tido coragem, me expus, me machuquei e machuquei muita gente, e essa música me reconfortou. Se der a louca ainda tatuo: “Deixa-me amar da minha maneira. Assumirei meus erros, mas só se erro for!”. O Antonio não sabe, mas ele compôs essa música pra mim.

“A química de um possível amor” é uma dessas que traz os falsetes fitopaezianos. Gosto muito do Fito Paez, gosto muito da música argentina. A parte instrumental, quando começa, me lembra alguma coisa do jazz/country/folk/blues de Norah Jones. A melodia da canção quebra essa impressão, mas quando escuta-se apenas o instrumental, me lembra aquela linda menina de cabelos e olhos negros e voz irresistível (e ainda toca piano...).

“Teus olhos” cai de novo no folk, essa eu vejo o clip com animações de velho oeste, Antonio de chapelão estilo John Wayne, Jiva Lin de vestido de prenda, Barreto como o vilão que será escurraçado pelo mocinho, e por aí vai. As intervenções do Carqueja tornam a canção divertida, e os slides do Jiva dão a envelhecida que a música precisa para cumprir seu ideal.

Por fim, “Quem de nós” foge das dores do coração e traz na letra a insatisfação com o mundo, que não deixa também de ser uma dor do coração. Esta música conta com a participação de Bruna Gargioni, não a conhecia. Aliás, ainda não a conheço. A primeira vez que ouvi, fiquei com a sensação de estar ouvindo uma cantora de jingles. Daquelas que no intervalo do Jornal Nacional entoam: “Globoveeeeel Veículoooosss, Ford é na Globooooveeeeeelll”. Ouvindo de novo, e de novo, e de novo, percebi que mais uma vez minha impressão estava sendo maculada pelas informações que trazia registradas no meu inconsciente. É inevitável buscarmos alguma informação no nosso HD cerebral para compararmos com o novo que nos chega. Aconteceu com a voz cantante do Antonio, aconteceu com a voz cantante da Bruna. Novas informações sempre acabam por pisar no terreno lodoso das sensações incertas.

Resumo da ópera, Antonio nos oferece uma obra muitíssimo bem acabada, ao que me parece feita sem pressa, com todo o cuidado necessário. Algo feito por alguém que não tem a necessidade dos holofotes, mas o compromisso com a qualidade. Bem produzido, bem arranjado, bem executado, bem gravado, enfim, tenho gravado no Adolfo (meu computador), um ótimo disco, que vez ou outra servirá de trilha para meus escritos.

Você que chegou até aqui, concorde ou discorde de tudo o que eu escrevi até agora, escutando-o. Paratanto, clique aqui


Parabéns, Antonio.
Obrigado, Antonio.

Um comentário:

Matheus Gargioni Köche disse...

Olá...
gostaria de saber qual foi a segunda impressão que minha voz deixou nos seus ouvidos?
sua resposta aumentará os degraus de minha escada!

abraços
Bruna Gargioni